segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Memórias e um poema de Natal

(Não houve espaço na nossa edição especial de Natal do Jornal FAS para este texto que explica a seleção de um poema aí colocado. Fica aqui, no nosso blogue. De Isabel Braga)

Memórias e um poema de Natal
Dos Natais da minha infância guardo o mistério do Menino Jesus que descia pela chaminé e que vinha colocar nos nossos sapatos deixados em cima do fogão as prendas que desejávamos durante um ano inteiro! Sempre achei que os  sapatos no fogão era pouco higiénico, mas como era assunto de  Menino Jesus, lá nos salvaria das doenças…
Bem, aquele Menino Jesus da nossa chaminé de fogão elétrico não seria muito de fiar pois guardo o desapontamento de uma prenda pedida, desejada, ansiada ardentemente e que não me foi colocada no sapato num certo  Natal: mais um irmão, um boneco a sério para eu brincar. Estranhamente, só chegou em março… Mas os crescidos  garantiram-me que tinha sido uma questão de atraso e que março era um bom mês para ser natal de uma menina-ai-jesus…
Dos Natais, guardo o pinheiro com o seu odor verdadeiro, a resina que se nos colava aos dedos  e as bolas de fino vidro que o enfeitaram anos e anos, conservadas em caixas e papel , mas que por vezes se partiam em mil pedaços. O enfeite do topo, uma  estrela prateada era esplendorosa. Rivalizava, em fascínio, com as pequenas figuras do presépio que incluíam o burrinho e a vaca, proscritos ultimamente.  
Guardo  as nuvens de vapor das grandes panelas que se abriam às travessas do bacalhau com todos e molho fervido. Guardo o sabor dos filetes de polvo enfeitados com salsa que antecipavam tudo isso e o odor das rabanadas e mexidos que generosamente denunciavam quantidades de açúcar e mel (pouco cozido, senão estraga!) que hoje nos fazem arrepiar mas que continuamos a comer, com remorsos…
O açúcar tão branco e fino que unia as frutas coloridas do bolo rei fascinava-me e, como toda a gente, eu desejava a prenda embrulhadinha em papel de seda  e temia a fava.  Guardo também a lembrança dos apertões do quebra-nozes nos meus dedos pequeninos, tentando as habilidades dos mais velhos.
Mas o melhor de tudo era estarmos juntos. Como estávamos todos os dias, é bem verdade, mais os avós e os tios, que também estavam connosco tantas vezes, noutros dias do ano… Mas nessa noite jogávamos ao rapa e aos pinhões. E cantávamos, representávamos, recitávamos poesias. Todos tínhamos um momento a que não podíamos escapar, de apresentar o nosso “número”, onde nos sentíamos à prova mas tão acarinhados pelos outros. 
O reportório era variado e com alguma exclusividade. Cada um de nós, os sete irmãos,  tinha  a sua  história, a sua  canção, o seu poema. O mãe e o pai também. A minha irmã, acima de mim, tinha a sorte de dizer a história  que eu sempre considerei mais bonita, sensível e generosa. E que bem ela a contava com os seus olhos e voz tão expressivos. Aquele poema teria  vindo dos livros de escola primária de minha mãe que o sabia de cor e nos ensinou? Teria sido ensinado pela  professora primária dessa minha irmã? Para mim, durante tantos anos, foi um poema de  “tradição oral”. Só recentemente pesquisei na  internet, para  tentar identificar a sua origem. E foi fácil encontrar, pois então…
Todos os anos continuamos o nosso ritual de Natal. Uns já partiram, outros se apresentam com os antigos e novos números…  Mas este continua a ser o meu preferido. Da autoria de  Adolfo Simões  Müller, o poema "A última prenda do Menino Jesus".

2 comentários:

  1. Obrigada, João pelo teu comentário. É bom termos boas memórias dos nossos natais, da nossa vida... Tive vontade de as partilhar com os alunos da escola pois a "memória" é algo muito importante onde alicerçamos o presente e o futuro. E temos de nos lembrar da nossa responsabilidade, nós, TODOS OS SERES HUMANOS, de construirmos BOAS MEMÓRIAS! Vivendo um presente positivo, de esperança, estaremos a fazê-lo. Mesmo que as contrariedades pareçam grandes demais... Espero que todos saibamos encontrar em nós uma luz que nos anime um pouco e, sobretudo, que ilumine também quem está ao nosso lado...
    BOM NATAL!

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